Por Trás do Véu da Negligência: O Terror Silencioso na Nigéria
Na paisagem árida do noroeste da Nigéria, por trás da aparente calma da floresta que cerca a vila de Rijana, no estado de Kaduna, esconde-se um inferno na Terra. Este inferno, alertam jornalistas e defensores dos direitos humanos, não é uma metáfora, mas uma realidade brutal onde centenas de cristãos estão sendo mantidos como reféns, acorrentados, torturados e privados de comida. Eles são vítimas de uma campanha de terror implacável, orquestrada por uma milícia étnica fulani com o objetivo declarado de "transformar a Nigéria em um califado". Este cenário de horror, embora documentado por grupos como a Truth Nigeria, permanece em grande parte ignorado pelo governo nigeriano e pela mídia, envolto em um silêncio perturbador que só serve para perpetuar o sofrimento.
O quadro sombrio foi revelado em detalhes durante uma coletiva de imprensa no Capitólio, em Washington, D.C., onde especialistas e ativistas compartilharam as descobertas de investigações de campo. Douglas Burton, editor sênior da Truth Nigeria, uma iniciativa da organização Equipping The Persecuted, descreveu a situação com termos alarmantes. Segundo ele, estima-se que "500 ou 600 pessoas na floresta agora" estejam em cativeiro nesses campos de terror, que operam desde dezembro do ano passado. Burton ressaltou que milhares de pessoas já passaram por esse sistema, e muitas não sobreviveram.
As histórias dos sobreviventes pintam um retrato de crueldade inimaginável. Em entrevistas com a Truth Nigeria, eles relataram ter sido submetidos a espancamentos regulares e à privação de alimentos, em uma estratégia de enfraquecimento físico e psicológico. A morte se torna uma ferramenta de extorsão; reféns são executados friamente se suas famílias não conseguem pagar o resgate exorbitante exigido pelos sequestradores.
A história de Esther, uma mãe que foi sequestrada junto com sua filha de 10 meses, Anita, é um testemunho pungente da brutalidade desses grupos. Capturada em sua casa, ela foi levada para o enclave de Rijana, onde presenciou a execução de duas pessoas. Durante seu cativeiro, os sequestradores proibiram-na de rezar, mas a oração foi o seu único refúgio e fonte de esperança. Em um episódio de horror absoluto, um dos terroristas tentou sufocar sua bebê, que chorava, cobrindo seu nariz e boca. A libertação de Esther, em agosto de 2025, foi um milagre, mas a cicatriz emocional do que viveu jamais será curada. Ela rezava por sua libertação, uma oração que ecoava o grito silencioso de tantos outros que continuam presos.
A Tribo Fulani e a Ideologia por Trás da Violência
Para entender a complexidade do problema, é crucial contextualizar a violência. Judd Saul, diretor executivo da Equipping The Persecuted, foi enfático ao identificar os agressores: "Os sequestradores são fulani. Eles fazem parte da milícia étnica fulani... Esta é uma tribo muçulmana jihadista que está determinada a transformar a Nigéria em um califado."
Embora o povo fulani seja um dos maiores grupos étnicos da África, e muitas de suas linhagens não apoiem o extremismo, uma facção radical vem cometendo atrocidades. Eles têm focado seus ataques em comunidades agrícolas predominantemente cristãs no Cinturão Médio da Nigéria, resultando em milhares de mortes e no deslocamento massivo de populações.
O governo nigeriano, no entanto, persiste em uma narrativa de negação, minimizando a violência como um mero "conflito entre agricultores e pastores" exacerbado por fatores como as mudanças climáticas. Essa versão dos fatos, no entanto, é veementemente contestada por ativistas. Judd Saul e outros defensores insistem que o conflito é de natureza religiosa. "Isso não é mudança climática, não são conflitos entre agricultores e pastores", disse Saul. "Não, isso são islamistas radicais praticando uma jihad na vida real diante dos nossos olhos."
A Comissão dos Estados Unidos sobre Liberdade Religiosa Internacional (USCIRF) também expressou preocupação de que a violência está "claramente agravando as tensões religiosas". A desclassificação da Nigéria da lista de "Países de Preocupação Especial" pelo governo Biden em 2021, uma decisão que a USCIRF criticou, é vista por muitos como um erro diplomático que falhou em reconhecer a gravidade da situação no país.
O Silêncio da Mídia e a Cumplicidade do Governo
A ausência de cobertura sobre esses campos de terror na mídia nigeriana e internacional levanta sérias questões. Burton acusou o governo nigeriano de subornar jornalistas para "mantê-los em silêncio", escondendo a verdade e a dimensão da crise. O governo alega ter resgatado alguns reféns, mas esses relatos não puderam ser verificados por jornalistas independentes, o que torna a veracidade das informações questionável.
A negligência do governo não se limita a esconder a verdade. Vários oradores na coletiva de imprensa afirmaram que as autoridades estão cientes da existência dos campos de treino terrorista e ignoram relatórios de serviços de inteligência que alertam sobre ataques iminentes a comunidades cristãs. Burton salientou a falta de resposta do governo a relatórios e ligações telefônicas, e a incapacidade de ajudar a resgatar as vítimas.
O silêncio do governo e da mídia não é apenas uma falha; é uma cumplicidade que legitima a impunidade dos agressores. Ao minimizar a natureza religiosa e étnica do conflito, o governo nigeriano permite que os perpetradores continuem suas atrocidades sem medo de repercussão.
O Apelo por Ação Global
Diante da falta de ação local, os defensores da liberdade religiosa estão apelando à comunidade internacional. Judd Saul enfatizou que, enquanto muitos já ouviram falar de sequestros na Nigéria, a pergunta fundamental permanece sem resposta: "O que acontece com as pessoas depois que são sequestradas?" A resposta, dolorosamente, é que elas são submetidas a tortura, fome e execução. Saul alertou que, se nada for feito, “milhões de cristãos vão morrer.”
A situação exige uma resposta multifacetada. A reintegração da Nigéria na lista de Países de Preocupação Especial do Departamento de Estado dos EUA é uma das soluções propostas. Isso não apenas colocaria o governo nigeriano sob pressão para proteger suas minorias religiosas, mas também enviaria uma mensagem clara aos agressores de que suas ações não serão toleradas pela comunidade global. Além disso, os defensores propuseram responsabilizar financeiramente os patrocinadores desses grupos extremistas, cortando seu financiamento e impedindo-os de cometer novas atrocidades.
A história dos cristãos na Nigéria é um lembrete sombrio de que a perseguição religiosa não é um fenômeno do passado. Ela continua a moldar o presente, e a apatia, seja por parte dos governos ou da comunidade global, só fortalece as mãos dos opressores. A coragem de sobreviventes como Esther e a determinação de jornalistas e ativistas que se recusam a se calar são a única esperança de que a luz da verdade possa, eventualmente, dissipar as sombras do terror.
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