Pastora é baleada na cabeça por traficantes em Salvador mesmo após marido mostrar Bíblia e se identificar como cristãos
A noite do último sábado (5) terminou em tragédia para uma família de pastores evangélicos na cidade de Salvador (BA). Após participarem de um culto e levarem um conhecido para casa no bairro da Engomadeira, a pastora Carine Carvalho foi baleada na cabeça por traficantes armados, mesmo depois de seu marido, o pastor Manoel Carvalho, mostrar uma Bíblia e se identificar como líder religioso.
O caso chocou a comunidade cristã em todo o Brasil e reacendeu o debate sobre a escalada da violência urbana, a atuação do tráfico de drogas em áreas dominadas por facções e o risco enfrentado por líderes religiosos que trabalham em comunidades vulneráveis.
O ataque
O casal retornava de um culto acompanhado dos filhos, de 15 e 20 anos, e de um conhecido que mora no bairro da Engomadeira. Ao se aproximarem da entrada da comunidade, foram abordados por criminosos armados. Manoel, o motorista do carro, informou que eram pastores e mostrou sua Bíblia aos traficantes. A atitude pareceu ser suficiente para garantir a entrada no local — ao menos naquele momento.
Porém, ao tentar deixar a comunidade, o carro da família foi alvo de tiros disparados por criminosos. Um dos disparos atingiu a pastora Carine de forma gravíssima: o projétil entrou pela nuca e saiu pela testa.
A luta pela vida
Logo após o ataque, Carine foi levada em estado gravíssimo para o Hospital Geral Roberto Santos (HGRS), onde passou por uma cirurgia de quatro horas. O quadro inicial era crítico, mas a equipe médica conseguiu estabilizá-la.
A pastora permanece internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Segundo informações da família, ela foi retirada da sedação e seu quadro, apesar de ainda grave, é considerado estável.
A fé que sustenta
Em entrevista à TV Bahia, o pastor Manoel Carvalho demonstrou profunda dor, mas também resiliência e fé. Para ele, o livramento da morte da esposa foi um milagre em andamento.
“Ela está nas mãos do Senhor. O quadro dela é estável, já tiraram a sedação. Jesus está cuidando dela. O Espírito Santo está nos fortalecendo”, declarou.
A Igreja Batista Casa de Oração, liderada pelo casal, publicou nas redes sociais um apelo por orações:
“Pedimos que orem por nossa Apóstola Carine! Não cessem de orar porque quanto mais oração, mais poder”, dizia o comunicado.
Os filhos estavam no carro
Outro fato que aumenta a gravidade do ataque é que os filhos do casal estavam no veículo no momento dos disparos. Apesar do susto, ambos não foram atingidos fisicamente.
A cena do ataque foi descrita como violenta e traumática, e a família está abalada emocionalmente, mas unida em oração pela recuperação da pastora. O caso tem causado comoção entre fiéis, amigos e até mesmo desconhecidos, que têm se mobilizado nas redes sociais com correntes de oração e mensagens de solidariedade.
Zona de guerra: o controle do tráfico no bairro da Engomadeira
O bairro da Engomadeira, onde ocorreu o atentado, é conhecido pelas disputas territoriais entre facções criminosas. A presença do tráfico de drogas é constante, e os moradores convivem diariamente com tiroteios, ameaças e medo.
Segundo informações da Polícia Militar, a segurança na região foi reforçada após o ataque. No entanto, moradores relatam que as ações são pontuais e não resolvem o problema estrutural da violência na comunidade.
“É um lugar onde a gente vive com medo. Qualquer carro que entra já é suspeito. Eles [traficantes] decidem quem vive ou quem morre aqui”, contou um morador, sob anonimato.
O que diz a Polícia
O crime está sob investigação da Polícia Civil da Bahia, que ainda não divulgou detalhes sobre a autoria dos disparos nem se há suspeitos identificados.
De acordo com um policial que acompanhou o caso, a família foi liberada na entrada, mas na volta acabou sendo confundida ou deliberadamente atacada:
“Eles estavam dando carona a uma pessoa que mora ali dentro e até se identificaram, informando que eram religiosos. O pastor mostrou a Bíblia. Por isso, conseguiram entrar. Mas, na volta, os traficantes atiraram contra eles”, afirmou o agente.
As autoridades acreditam que o casal pode ter sido confundido com membros de grupos rivais ou que os criminosos tenham desconfiado de sua presença por estar levando um morador do bairro.
Repercussão nacional
O ataque repercutiu em todo o país e foi amplamente compartilhado nas redes sociais, especialmente entre igrejas evangélicas. Diversos líderes religiosos se manifestaram em apoio à família Carvalho, pedindo justiça e oração.
O caso também acendeu o alerta para a vulnerabilidade de missionários e líderes religiosos em comunidades dominadas pelo tráfico. Muitos atuam de forma voluntária, arriscando a própria vida para levar apoio espiritual e social a populações marginalizadas.
Um retrato da violência que atinge todos
O caso da pastora Carine é mais um exemplo trágico de como a violência urbana tem rompido barreiras religiosas, sociais e geográficas. Nem mesmo líderes espirituais, conhecidos na comunidade, estão isentos dos riscos impostos por criminosos armados.
Especialistas em segurança pública alertam que a atuação de facções em bairros periféricos tem crescido de forma alarmante em Salvador e outras capitais do Nordeste. A presença do Estado, muitas vezes, se limita a operações pontuais, sem um plano de longo prazo que envolva policiamento, educação e desenvolvimento social.
O papel da igreja em áreas de risco
Igrejas evangélicas são frequentemente um ponto de apoio para moradores em comunidades carentes, oferecendo desde alimentos até assistência emocional e espiritual. Pastores e missionários, como Carine e Manoel, muitas vezes são os únicos representantes de esperança em meio à violência.
A atuação da Igreja Batista Casa de Oração na Engomadeira é conhecida por seu trabalho de acolhimento e evangelismo. O ataque sofrido pelo casal mostra o quanto até mesmo ações pacíficas podem ser mal interpretadas ou se tornarem alvos de violência em zonas de controle do tráfico.
O atentado contra a pastora Carine Carvalho é mais do que um crime violento — é um símbolo de um país em que a fé e o trabalho comunitário são desafiados pela brutalidade e pela ausência do Estado em locais tomados pelo medo.
Enquanto a pastora segue lutando pela vida em uma UTI de Salvador, a sociedade brasileira precisa refletir sobre o que realmente significa liberdade, segurança e fé em um território onde a violência não poupa nem os que pregam o amor ao próximo.
A mobilização nacional por justiça, proteção e oração revela a força da comunidade cristã diante da dor — mas também denuncia, silenciosamente, um sistema falho que permite que inocentes sejam feridos em plena missão de paz.

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