Em um cenário de cantos tradicionais, arcos envergados, bolas rolando no campo e expressões ancestrais de força, habilidade e união, os Jogos Indígenas 2025 realizaram mais uma edição memorável na Aldeia Taquaral, localizada no município de Aripuanã, interior de Mato Grosso. Nos dias 19 e 20 de abril, comunidades indígenas se reuniram para muito mais do que uma disputa esportiva: vivenciaram um verdadeiro reencontro com suas raízes e reafirmaram sua identidade cultural diante do Brasil.
O evento, que já é referência no calendário local, contou com competições como Arco e Flecha, símbolo de ancestralidade, e Futebol Society, que uniu tradição e contemporaneidade. Mais do que os resultados, os jogos marcaram uma poderosa mensagem de resistência: os povos indígenas seguem firmes, fortes e protagonistas da própria história.
Este artigo explora não só os detalhes da edição 2025, mas o significado social, político e cultural que os Jogos Indígenas representam para as comunidades originárias e para o país.
Esporte como elo entre gerações e culturas
A prática esportiva, entre os povos indígenas, não é apenas uma atividade física — é uma extensão da cultura, dos rituais, das histórias orais e dos costumes passados de geração em geração. Por isso, os Jogos Indígenas têm ganhado importância crescente em diversas regiões do Brasil, funcionando como plataformas de visibilidade, empoderamento comunitário e integração entre etnias.
Na Aldeia Taquaral, os dias de competição foram cercados por um clima de celebração e respeito. Atletas e líderes das etnias Cinta Larga e Arara protagonizaram os jogos, demonstrando destreza em provas tradicionais e revelando, ao mesmo tempo, a diversidade e a unidade entre os povos.
Destaques da edição 2025
🏹 Arco e Flecha: técnica, memória e honra
A modalidade de Arco e Flecha é uma das mais simbólicas dos Jogos. Mais do que mirar em alvos, ela carrega um sentido ritualístico e identitário. A pontaria de Nonato Arara, campeão da disputa, foi destaque absoluto da edição. O segundo lugar teve um empate múltiplo envolvendo Roni Cesar Cinta Larga, Alex Cinta Larga, Aline Cinta Larga, Davi Cinta Larga, Paulo Roberto Cinta Larga e Caio Arara — um exemplo de como a competição também celebra a igualdade e o companheirismo.
⚽ Futebol Society: força, técnica e protagonismo feminino
As disputas de Futebol Society também movimentaram a aldeia. Na categoria feminina, a equipe Forças Unidas sagrou-se campeã, vencendo Wanzeej Pakup Pit, que ficou com a segunda colocação. Já no masculino, a vitória foi da Equipe Taquaral, com a Equipe Cachoeirinha em segundo lugar. As partidas revelaram o talento e a paixão das comunidades indígenas pelo esporte mais popular do país, com destaque para a presença crescente de mulheres indígenas nos esportes competitivos.
Muito além do esporte: a força da cultura viva
O evento não se restringiu às competições. Pinturas corporais, danças tradicionais, instrumentos musicais, cantos cerimoniais e rodas de conversa integraram a programação dos Jogos. Cada apresentação foi uma oportunidade para resgatar e mostrar ao público o universo simbólico e espiritual das etnias presentes.
Esses momentos são fundamentais para combater a invisibilização histórica que os povos indígenas sofreram — e continuam sofrendo — no Brasil. Cada canto, cada dança e cada história contada no entorno da fogueira é uma aula de resistência, ancestralidade e dignidade.
Apoio institucional e compromisso político com os povos originários
A prefeita Seluir Peixer Reghin, presente nos dois dias de evento, reforçou o papel da administração municipal na promoção e valorização da cultura indígena:
“Temos etnias importantes como Cinta Larga e Arara que precisam do nosso apoio para valorizar essa cultura e incentivá-los a mostrar para o povo de Aripuanã e do Mato Grosso como são suas tradições. É nossa obrigação como Poder Público.”
O secretário de Esporte e Cultura, Evandro Carlos de Oliveira, também destacou a importância da continuidade desses investimentos:
“O indígena faz parte da cultura de Aripuanã e da história do nosso povo. Apoiar eventos como esse é uma forma de preservar e valorizar essa herança.”
Além da Prefeitura de Aripuanã, a realização contou com o envolvimento direto de diversas entidades como a Secretaria de Infraestrutura (SINFRA), a empresa NEXA, e as organizações Jurupará Socioambiental, SETEC e SAEL, que colaboraram para garantir a logística, segurança, infraestrutura e suporte cultural.
O impacto transformador dos Jogos Indígenas
Integração comunitária
Os Jogos servem como ponto de encontro entre aldeias, fortalecendo os laços comunitários e promovendo trocas entre jovens, anciãos, guerreiros e lideranças. São espaços onde conhecimentos tradicionais circulam, são atualizados e se adaptam aos tempos modernos, sem perder a essência.
Autoestima e protagonismo juvenil
Jovens indígenas que participam das competições retornam às suas aldeias com nova percepção de si mesmos. Sentem-se valorizados, representados e motivados a preservar e defender suas culturas. A prática esportiva, aliada à valorização cultural, funciona como poderosa ferramenta contra o aliciamento por crimes ambientais, exploração ilegal e evasão escolar.
Turismo cultural e geração de renda
Eventos como esse também contribuem para o turismo de base comunitária, atraindo visitantes interessados em vivências autênticas. Com isso, há oportunidades de geração de renda local, venda de artesanato, culinária típica e serviços de guiamento cultural.
A força do símbolo: por que esses jogos importam
Num Brasil em que os povos indígenas ainda lutam pelo direito à terra, à educação de qualidade e ao respeito às suas tradições, os Jogos Indígenas não são apenas uma celebração. São um ato político, simbólico e espiritual. São um lembrete ao país — e ao mundo — de que há um Brasil profundo, plural, que resiste e floresce em meio às florestas, às aldeias e às montanhas.
Promover esses eventos é garantir que a história continue a ser contada por quem a vive, não por quem apenas a observa de fora. É dar voz, vez e palco para culturas que sustentam parte importante da identidade nacional brasileira.
Os Jogos Indígenas 2025 da Aldeia Taquaral foram mais do que uma competição. Foram um grito de vida, resistência e celebração. Com flechas disparadas, gols marcados, cantos entoados e passos firmes sobre a terra ancestral, os povos indígenas de Aripuanã mostraram ao país que a cultura originária continua viva, forte e imprescindível.
Eventos como esse precisam ser ampliados, replicados e permanentemente apoiados por políticas públicas responsáveis, conscientes e dialogadas. O Brasil só será verdadeiramente justo e diverso quando suas raízes forem reconhecidas não como passado, mas como presente e futuro.
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